Entre fatos e boatos: um chamado ao discernimento bíblico
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“Não julgueis, para que não sejais julgados” (Mateus 7:1)
Na cultura popular, duas máximas frequentemente repetidas merecem uma análise crítica. A primeira diz que “onde há fumaça, há fogo.” A segunda, um provérbio português, afirma que “o povo aumenta, mas não inventa.” Apesar de parecerem inofensivas, essas expressões muitas vezes servem como justificativa para prejulgamentos que podem causar danos irreparáveis.
O prejulgamento — ou seja, formar opiniões ou emitir juízos sem base suficiente — é uma prática severamente advertida nas Escrituras. O próprio Cristo nos exorta: “Não julgueis, para que não sejais julgados. Porque com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que tiverdes medido vos hão de medir a vós” (Mateus 7:1-2). Esse ensino não é apenas um conselho, mas um princípio essencial para a convivência justa e harmoniosa.
Em 2014, Fabiane Maria de Jesus, de 33 anos, foi vítima de um prejulgamento cruel. Ela foi espancada por dezenas de moradores de Guarujá, litoral de São Paulo, após ser identificada como a pessoa de uma foto falsa que circulava na internet. O boato alegava que a mulher sequestrava crianças para rituais de magia negra. Baseados nesse “reconhecimento”, os moradores decidiram fazer “justiça com as próprias mãos.” Dois dias depois, Fabiane faleceu. A nota que originou a tragédia era completamente falsa.
Outro caso emblemático ocorreu anos antes, em São Paulo. Um casal que trabalhava com transporte escolar foi acusado de abusar sexualmente das crianças sob seus cuidados. A mídia divulgou extensivamente as acusações, e a opinião pública logo os declarou culpados. No entanto, após investigações, descobriu-se que as denúncias eram infundadas, e o casal era inocente. Sendo absolvidos das falsas acusações, o Ministério Público deu o caso por encerrado e permitiu a troca dos nomes dos acusados para que pudessem iniciar uma vida nova. Mas o prejuízo foi incalculável e as feridas criaram marcas que ficarão para sempre na memória.
Nos dois casos citados, a “sabedoria popular” revelou ser uma enorme ignorância: havia fumaça, mas não fogo; o povo inventou e aumentou, sem dó nem compaixão, com o agravante de falsos testemunhos. É certo que até aqueles que fazem uso de tais regras não querem ser julgados pelos mesmos critérios. Este julgamento impiedoso, injusto e punitivo é severamente combatido por Jesus: “Não julgueis, para que não sejais julgados. Porque com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que tiverdes medido vos hão de medir a vós” (Mateus 7:1-2). Comentando o ensino de Jesus, William Barclay disse bem: “Houve tantos casos de julgamentos equivocados que se acreditaria que os homens deveriam aprender a abster-se totalmente de julgar a outros.” Os juízes erram, quanto mais as pessoas comuns.
Consideremos, pois, estas exortações: “Não andarás como mexeriqueiro entre o teu povo; não te levantarás contra o sangue do teu próximo” (Levítico 19:16); “Não façais juízo segundo a aparência, mas julgai segundo a reta justiça” (João 7:24); “Não julgueis coisa alguma antes do tempo, até que o Senhor venha, o qual também trará à luz as coisas ocultas das trevas” (1 Coríntios 4:5).
Nossa responsabilidade como cristãos é buscar a verdade fundamentada em fatos, não em rumores. Devemos exercitar o discernimento com sabedoria e amor, lembrando sempre que “o amor cobre multidão de pecados” (1 Pedro 4:8).
“Ouvi dizer” não é, necessariamente, verdade. Nossa opinião deve ser formada com base em fatos, e não em boatos. Cuidado com as calúnias, além de ser pecado, têm poder destruidor. Podemos formular juízo, opinião embasada, mas não estabelecer prejulgamentos nem condenações. Deus nos deu senso crítico, mas não nos constituiu juízes. E, finalmente, a Bíblia e não a “sabedoria popular” deve reger nossas convicções e ações. Pense nisso!